segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Algumas lições

Numa triste casa pobre e pequena,
De uma cidade grande qualquer,
Há um feixe multicor, daqueles bem falantes,
E cheio de elétrons – apaixona os visitantes, -
Estes não o deixam arrefecer.

Luz mal guardada na sala de jantar,
Que os insetos circundam em adoração,
Por sobre a toalha colorida por arabescos
No registro preguiçoso das horas às duas, -
Marasmo da sesta latino-americana
Onde os dias mal passam no calendário de girassol,
Contando os costumes de Itaparica

Allons-nous en, mes amis! – começa a aula viajante
De língua francesa, virando à esquerda para o selvagem
Brasil tupi, bem antes dos casos do sertão,
Embarcamos na canoa dos índios, conduzida pelo timoneiro ancião.
Em Meca, anjos maometanos que não crê,
Apresentaram-lhe o idioma do cão.

Versou com as escrituras vermelhas por ingênuo amor,
Bradando os ensinamentos de Marx e as ações de Lênin!
Entre o vinho e a água aprendeu alemão com Goethe e os estudantes.
Poderia adentrar o Olimpo falando a língua dos deuses,
Mas certamente rejeitaria seu manjar demagógico

As noites ébrias com russos e russas foram substituídas
Pelas madrugadas nos porões do Capelão,
De surras aguardadas em aflição e temor
Medo de não mais poder beijar sua esposa e sua prole,
Chorosa no martírio e na abrupta felicidade,
Dias depois, pelo regresso da aurora e do pai.

Derramou sobre as camas das crianças sem sobejos
As histórias da infância de malas nas mãos pela Bahia,
Dançando o samba de roda nos terreiros,
Em companhia da mãe nos feitiços de pedras mágicas,
Abalou a crença do babalorixá ao tocá-las

Ignorando as rígidas admoestações dos frades,
Fugindo com seu pai para o lanche das emoções,
Compartilharam e fizeram as histórias seculares do Sodré
Sem saber nadar nas lágrimas vertidas pelo seu herói
Ao ver no guarda da esquina seu sobrinho desconhecido
Coincidências que só o sortilégio das luas pode sustentar

Hoje, a luz irradia a esperança cheia de têmpera.
Experiente, guia as turmas de jovens,
Aconselha e afaga a mente dos Sonhadores
Com a baianidade e simplicidade sofisticada
Jamais vista num par de olhos.

Duas horas de latido de cão bobo,
Passeios na Antigüidade e nas velhas páginas das gramáticas
Desenhando mapas dos globos da alma e da Terra.
Finda a aula, é hora da compra diária de pão francês
E a luz, mais vermelha que nunca,
Sobe a ladeira, rumo à boulangerie.

segunda-feira, 16 de outubro de 2006

O Sarcasmo das Flores

O céu azul com poucas nuvens
E o desabrochar primaveril dos bosques
Urbanos de ipê-rosa,
Todo este clichê do renascer à esta estação
Não significa mais que uma dolorosa ironia
Das petulantes pétalas, impetuosas ao ferir
A indisposição inabalável do amigo Jair.

Passeia pelos cômodos sorumbático
Abre as janelas – extravasa cheiro de consultório médico,
A rua decompõe-se em recém-impregnado olor místico
Que parte do casebre deprimido e exótico
Precipitando troça nauseabunda no passeio público.

Este foi o dia de suas exéquias sociais –
Julgava-se desimportante e vestigial,
Uma pústula comunitária
Mas foi surpreendido por sua plenitude microcósmica;
Ser alvo dos folguedos crocitados até pelas partículas de poeira,

Talvez fosse sua formação universitária –
Desempenhava com louvor seu papel de ser
Isolado pelos próximos e demagógico consigo mesmo
Na congeladora vastidão siberiana de seu cérebro
Imprestável desajeitado à vida da porta para fora,
Uma pena ele nem ao menos se suportar.
Fantástica atuação de sua pobre estagnada realidade
Clap, clap, clap, clap.

Tenro vitelo proposto ao abatimento,
Entregue aos predadores da alma,
Derrotado pelos anseios adormecidos,
Malogrado viver fadado ao fim suicida
Jair que já foi, sem nem sair do lugar.

sexta-feira, 13 de outubro de 2006

Uma pesquisa paciente fará você ficar mais feliz e inteligente

Você é feliz? Esta pergunta está com certeza entre o grupo das mais complicadas de responder, pelo menos para mim. Nos últimos anos, institutos de pesquisa têm feito bastantes inquéritos à população sobre felicidade, fazendo exatamente a mesma pergunta do início deste texto. Há o “sim”, o “não” e o “não sabe/não respondeu”. Particularmente, repudio esta última opção de resposta – ou de não-resposta.
Ou a pessoa é ignorante demais para não responder ao pobre pesquisador ou demonstra simples falta de personalidade. Não sabe se é feliz? Bom, peça um tempo ao realizador do teste e analise, é o mínimo que pode pedir a ele. O recenseador não pode ceder-lhe tempo para responder? Paciência. Apenas peça para não constar na pesquisa como um dos que dizem não saber ou um dos mal-educados que ignoraram os homens e mulheres que com solércia realizam as pesquisas.
Se o pesquisador fizer a chula ameaça de colocá-lo nesse setor da pesquisa, argumente, lembre-se de quem fez birra primeiro foi você. Acaba virando uma questão de honra, uma pequena volta à infância e às briguinhas com os coleguinhas de sala; os chutes nas canelas e os arranhões nos braços. Você pode optar por uma dialética mais radical: mande-o enfiar essa mesquinha pesquisa neoliberal cosmopolita reto acima. Acalme-se! Não vá fazer isso com o bem-vestido entrevistador! Ou quer ser preso? Além de infeliz vão chamá-lo louco. É isso que quer? Não se desespere. Isso, isso. Está perto de conseguir, falando manso, dizendo que tem vergonha de aparecer nessas pesquisas, que é pressão demais para você. Pronto. Ele não te pôs na pesquisa. Agora você é apenas mais um dos malucos das cidades grandes.
Afinal, seria normal se demorasse de responder esta pergunta. Este não é o tipo de coisa que se tem uma resposta na ponta da língua sempre. O estado de espírito atual sempre influi, é óbvio. Mas levando em conta a intenção generalizante da pesquisa de uma vida feliz ou amargurada, é necessário que se pese os fatos. Eu mesmo, dezessete anos, teria que pedir umas boas duas horas pra montar um arquétipo de vida, e, ainda assim, não teria certeza ao responder. Teria apenas uma idéia passageira. Enfim, estas pesquisas de bate-pronto são a maior bobeira que existe e talvez elas só meçam o nível de precipitação da população. Elas são falhas. Uma pessoa extremamente irônica pode responder que é triste quando não o é; ou algumas pessoas com dificuldade de aceitarem-se tristes, preferem enganar a si mesmos com palavras de felicidade, e isto é o mais comum. Seres humanos adoram se enganar, e não há nada que eu possa fazer para mudar isto.

quinta-feira, 12 de outubro de 2006

alô

É, começando por aqui.

Tudo o que eu publiquei de julho ao início de outubro se encontra aqui:

http://febreonivoradeobservacao.weblogger.terra.com.br/